segunda-feira, janeiro 26, 2015

Sob as nuvens

- Eu quero ir embora....
- Quero fugir.
- Há pássaros demais nesse lugar.
- E vozes por todo lado...
- É, também ouço.
- Senti falta dos teus olhos azuis.
- Cinzas.
- Sim. Até te escrevi um poema.
- Mas você só escreve quando está triste!
- Quem disse?
- Você disse
- Ah, é. Mas te amar não é sempre feliz.
- Quem disse?
- Você disse.
- Ah, é. E como sabes que me amas?
- Eu sinto. É como se estivesse à beira de um penhasco, com um pé no chão e o outro no desfiladeiro, tocando o ar.
- Ah. Espero que o vento seja agradável lá em cima.
- O vento vem como música...
- Se teu beijo fosse música, seria um desses clássicos em que se pode ouvir um campo com flores.
- Se teu beijo fosse vento, seria um vendaval.
- Agradeço.
- Não há de que.
- Tenho medo de você me deixar.
- Tenho medo de te deixar.
- Acho que se você for mesmo embora, vou atrás de você...
- Se eu for mesmo embora, vou me perder de mim.
- Essas vozes...
- Fica aqui hoje?
- Não posso.
- Nem eu...
- Mas não vou te esquecer.
- Nem eu.
- Já é hora, então?
- Como vamos saber?
- Eu vivo uma vida inteira sabendo de quase nada.
- Mas ninguém sabe. Só há quem finja melhor...
- Nunca vou saber a hora de te deixar.
- Todas as despedidas são feitas de dúvida e nostalgia.
- Se formos embora estaremos numa cena de teatro?
- Teatro bem amador.
- Amador, amador... Ama e dor, amado, ama...dói.
- É justo. Adeus.
- Adeus.


Sem glória nem encanto, é o fim do último ato de nossas vidas.